Incidência de imposto de renda no pedido de demissão voluntária
Incidência de imposto de renda no pedido de demissão voluntária
Não deve incidir imposto de renda sobre verbas indenizatórias oriundas de adesão, pelo trabalhador, a Programa de Demissão Voluntária (PDV)
As leis tributárias brasileiras determinam que haverá incidência do imposto sobre renda sempre que o indivíduo ou a empresa auferirem renda, entendendo-se como renda o produto do trabalho, do capital, ou da combinação de ambos, além da percepção de proventos de qualquer natureza que representem acréscimo patrimonial.
O fato gerador do imposto, portanto, é a disponibilidade econômica ou jurídica da renda, entendimento já consagrado no âmbito tributário.
Nesse artigo vamos tratar de uma situação em que o recebimento de numerário pelo trabalhador não se enquadra no conceito de renda e, por isso, não deve ser tributado pelo IR, qual seja, o recebimento de verbas indenizatórias decorrentes da adesão ao programa de PDV.
Vale aqui antecipar que o Imposto de Renda não deve incidir sobre ingressos pecuniários de caráter indenizatório, que servem unicamente para reparar eventual dano causado a alguém, forma compensatória que visa restaurar ao estado anterior o patrimônio lesado.
Programa de demissão voluntária – PDV
O próprio governo federal divulga em sua página o seu claro entendimento acerca do que vem a ser, para fins tributários, um Programa de Demissão Voluntária.
Para a União, os programas de demissão voluntária – PDV são aqueles instituídos pelas pessoas jurídicas com o fim de incentivar o pedido de demissão espontânea de seus funcionários, excluindo-se desse conceito os programas que visam incentivar o pedido de aposentadoria ou outras formas de desligamento voluntário de empregados.
De fato, as empresas (públicas ou privadas) promovem planos de demissão voluntária como forma de diminuírem seus quadros de colaboradores sem, com isso, ter que arcar com todo o peso dos custos das dispensas sem justa causa que teriam que fazer em seu lugar, tal como determina a legislação trabalhista no Brasil.
Para atingirem esse fim, as empresas organizam e oferecem generosos pacotes de benefícios para que as pessoas se demitam de seus quadros voluntariamente.
Esses pacotes oferecidos pelas empresas nesses programas incluem a oferta de múltiplos de salários (normalmente variáveis a depender do tempo de casa da pessoa), manutenção temporária do funcionário no plano empresarial de assistência médica, complementação do plano de previdência privada, dentre outros benefícios.
As normas trabalhistas não determinam quais exatamente devem ser os benefícios oferecidos nos PDV´s das empresas. São elas (empresas) que, discricionariamente, fixam qual será o conteúdo do programa a ser oferecido. Elas devem calibrar o conteúdo de seus planos de demissão voluntária para alcançarem economia, mas ao mesmo tempo precisam torná-los atrativos, para incentivarem a adesão dos seus trabalhadores.
Incide IR sobre as verbas indenizatórias recebidas no PDV?
Pondo fim a uma discussão que esteve presente no Judiciário por muitos anos, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula nº 215 em que estabeleceu que as indenizações oriundas de adesões ao programa de incentivo à demissão voluntária não estarão sujeitas à incidência do Imposto de Renda.
A referida súmula diz assim: “A indenização recebida pela adesão a programa de incentivo à demissão voluntária não está sujeita à incidência do imposto de renda.”
Vejamos um exemplo para compreender como ficaria a questão na prática:
Vamos supor que um trabalhador tenha aderido a um programa de demissão voluntária, rescindindo assim seu contrato de trabalho e recebendo, portanto, algumas verbas indenizatórias, como adicional de horas extras, adicional noturno e valor proporcional de férias, conteúdo do pacote demissional incentivado. Tais verbas se caracterizam como uma forma de reparar o dano e o prejuízo causado ao trabalhador ao se desligar de seu vínculo empregatício, situação em que se aplica a mencionada Súmula nº 215 do STJ, já que na hipótese não se verifica um acréscimo patrimonial da pessoa, mas uma reparação patrimonial decorrente do desligamento do funcionário, mesmo na situação da adesão voluntária ao dito programa de demissão voluntária – PDV.
Como no caso do exemplo aqui retratado, e conforme o disposto no Código Tributário Nacional e na Constituição Federal, as verbas indenizatórias oriundas da adesão ao programa de demissão voluntária não se enquadram à regra matriz de incidência do Imposto de Renda. Assim, no caso de uma eventual retenção na fonte por parte do empregador, restaria configurada a ilegalidade de retenção, resultando no direito do trabalhador à repetição do ônus tributário indevidamente suportado por ele.
Como declarar as verbas indenizatórias recebidas?
Na declaração de ajuste anual do imposto sobre a renda da pessoa física o contribuinte deve ter o cuidado de segregar adequadamente quais são as verbas indenizatórias recebidas por conta de sua adesão a determinado plano de demissão voluntária daquelas que efetivamente são seus rendimentos tributados.
Tais verbas indenizatórias, para que os trabalhadores não sofram tributação, devem ser declaradas por eles na ficha “Rendimentos Isentos e Não Tributáveis”.
Quais verbas indenizatórias não são tributadas pelo Imposto de Renda?
A Receita Federal do Brasil divulga e mantém atualizado um rico conteúdo informativo acerca do imposto de renda das pessoas físicas, qual seja, o “Perguntas e Respostas”, mais conhecido pela comunidade jurídico-tributária como “Perguntão” (quando da elaboração deste artigo a edição atualizada é o Perguntas e Respostas 2022).
O entendimento da Receita Federal sobre o que não se inclui no conceito de verbas especiais indenizatórias, para fins de isenção do IR, é o seguinte (item 234 do Perguntão 2022):
Não se incluem no conceito de verbas especiais indenizatórias recebidas a título de adesão ao PDV:
a) as verbas rescisórias previstas na legislação trabalhista em casos de rescisão de contrato de trabalho, tais como: décimo terceiro salário, saldo de salário, salário vencido, férias proporcionais ou vencidas, abono e gratificação de férias, gratificações e demais remunerações provenientes de trabalho prestado, remuneração indireta, aviso prévio trabalhado, participação dos empregados nos lucros ou resultados da empresa; e
b) os valores recebidos em função de direitos adquiridos, anteriormente à adesão ao PDV, em decorrência do vínculo empregatício, a exemplo do resgate de contribuições efetuadas à previdência complementar em virtude de desligamento do plano de previdência.
Diante dessa informação, o contribuinte já sabe o que fazer: as verbas recebidas pelo trabalhador no âmbito de um plano de demissão voluntária, cujo entendimento da Receita Federal é pela incidência do imposto sobre a renda, devem ou ser oferecidas à tributação, ou terem a incidência de IR discutidas em juízo.
Por outro lado, a Procuradoria da Fazenda Nacional já expediu parecer (Parecer PGFN/CRJ/nº 1278/98) determinando “a dispensa e a desistência dos recursos cabíveis nas ações judiciais que versem exclusivamente a respeito da incidência ou não de imposto de renda na fonte sobre as indenizações convencionais nos programas de demissão voluntária, desde que inexista qualquer outro fundamento relevante.”.
Assim, em se tratando de verbas indenizatórias decorrentes de PDV´s, as discussões judiciais são dispensáveis, a não ser que haja conflito de entendimento entre contribuintes e União acerca do caráter indenizatória da verba.
Sobre esse ponto, Rogério Pereira da Silva, advogado tributarista e sócio do Escritório Tributário, explica que “O fisco ter seu próprio entendimento sobre determinada incidência tributária nem sempre significa que de fato uma determinada matéria deve ser submetida à tributação. O dever de pagar tributo decorre da lei e o fisco é só uma parte na relação jurídico-tributária. Para situações em ‘zona cinzenta’ o contribuinte deve sempre procurar guarida junto ao Poder Judiciário, com o apoio de um escritório de advocacia tributária especializado”.
Direito de restituição do valor indevidamente pago ao Imposto de Renda
Há casos, todavia, que o empregado sofreu tributação indevida do IR, mesmo sendo sua verba nitidamente indenizatória; há outros, contudo, que a natureza indenizatória do recebimento ainda deve ser reconhecida pelo Judiciário.
No primeiro caso, a mera retificação das declarações de imposto de renda da pessoa jurídica das respectivas competências, com correspondente pedido de restituição eletrônico, é capaz de resolver o problema e fazer com que o contribuinte receba de volta seu dinheiro.
Já para as situações onde a natureza indenizatória do recurso monetário recebido ainda é passível de questionamento, o contribuinte deve procurar obter um provimento judicial por meio da assessoria de uma advogado tributarista, momento em que deve optar se deseja receber tal restituição por meio de precatório ou por compensação, conforme a Súmula 461 do Superior Tribunal de Justiça.
Casos de retenção indevida do imposto de renda no PDV?
Situação muito peculiar é a do contribuinte sofrer a retenção do IR sobre verbas indenizatórias recebidas no âmbito do plano de demissão voluntária que aderiu, mesmo sua verba tendo natureza indenizatória.
É a situação muito comum do empregador que, diante da legislação tributária complexa (e muitas vezes lacônica), se decide pela posição mais conservadora, que é a de praticar a retenção em desfavor do empregado, mas se resguardando dos riscos fiscais de não a ter promovido (a retenção).
Para se prevenir disso, o contribuinte também pode se socorrer junto ao Poder Judiciário, ingressando com um mandado de segurança preventivo que vise demonstrar a natureza indenizatória da verba que receberá e, consequentemente, a não incidência o IR sobre ela.
Para obter uma liminar e, dessa forma, velocidade na obtenção do procurado respaldo judicial, deve demonstrar a probabilidade do seu direito e o perigo de dano caso a tutela judicial demore.
“Com a liminar em mãos a empresa fica impedida de efetuar a retenção tributária, ao mesmo tempo que fica a salvo de qualquer penalidade do fisco. Dessa maneira o empregado não sofre a retenção tributária e, assim, permanece com seu patrimônio protegido da tributação indevida”, explica Ely Odilon Ferreira, sócio do Escritório Tributário.